segunda-feira, 22 de março de 2010

Literatura Homoerótica

Tratar da Literatura Homoerótica ainda é tão complicado e difícil quanto a discussão sobre o desejo homoerótico em si, hajam vistos os preconceitos, mesmo de acadêmicos, que ainda giram em torno do assunto. Denílson Lopes, em seu livro O homem que amava rapazes e outros ensaios, afirma que a literatura gay não é aquela que retrata apenas o cotidiano sexual dos indivíduos com inclinação homoerótica, mas, principalmente, é aquela que transforma em arte a experiência do “sair do armário”, atitude que implica sérias conseqüências, longe dos estereótipos sociais e midiáticos.
A maioria dos estudiosos sobre o assunto concorda que o Brasil iniciou-se no campo da literatura homoerótica com Bom-Crioulo (1895), do cearense Adolfo Caminha. Desde então, apesar das severas críticas de alguns segmentos da sociedade e das rejeições do mercado editorial, fazem parte da produção literária brasileira, textos gays e lésbicos.
Isso se intensifica nas idéias e pensamentos libertários da contracultura dos anos 60/70, mas é a partir das décadas de 80/90, quando a “homossexualidade” deixa de ser considerada doença, pelo Conselho Federal de Medicina, com a luta dos movimentos gay-lésbicos, em defesa dos diretos destes, que acontece o impulso para a propagação dessa literatura.
Foucault, ao tratar desse assunto em Um diálogo sobre os prazeres do sexo, afirma que com o repúdio da cultura cristã sobre o homoerotismo, a literatura homoerótica “concentra sua energia no próprio ato sexual”, pois não se permitiu ao indivíduo homoeroticamente inclinado elaborar um sistema de corte, “uma vez que lhes foi negada a expressão cultural necessária a essa elaboração”. Já Jurandir Costa Freire, em A inocência e o vício
, diz que “a AIDS realçou definitivamente o arcaísmo cultural da noção de homossexualidade”, mas certamente também marcou a proliferação de escritos sobre o tema.
E Severo Sarduy, em “O Barroco e o Neobarroco”, leva-nos a concluir que o erotismo praticado pelos indivíduos homoeroticamente inclinados é um símbolo do jogo com o objeto perdido, haja vista a violação da finalidade, estabelecida pela visão clássica (judaico-cristã), para os corpos. Desse modo, o erotismo praticado pelos gays afirma uma incerteza, abrindo espaço para a contradição com os padrões da “normalidade” estabelecida.
A presença da temática homoerótica na literatura brasileira é bastante forte: Glauco Mattoso, Caio Fernando Abreu, Raul Pompéia, Valdo Mota, Roberto Piva... Sem esquecermos os inúmeros poemas e contos gays (muitos de qualidade duvidosa, como em qualquer tipo de literatura) que saltitam o tempo todo, tanto em sites direcionados ao público gay, ou não.
Por fim, acredito que é importante saber como a arte pode contribuir para uma visão mais sutil das relações afetivas entre “iguais” e como a discussão sobre o homoerotismo pode contribuir na compreensão da arte contemporânea.


(retirado do blog do Leonardo Davino. Paraioca "PB/RJ", mestre em Literatura Brasileira, com pesquisa de doutorado sobre Canção e Teoria da Literatura.)

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